terça-feira, 22 de maio de 2012

À côté de ta Fênetre

Embora houvesse chegado ao local adequado para partir, fui motivado por meus pensamentos latentes a não fazê-lo. Não ainda. Decidi andar um pouco mais, pelos caminhos que tão bem conhecia. Já na primeira parte do trajeto, deixei-me ser tomado pelo frescor daquelas lembranças que somente tu e eu sabemos. Por vezes penso que não são meras lembranças, pois rememoriá-las faz-me ascender, como da vez em que foram vividas com ineditismo, a sensação física de ter os dedos dormentes. Em seguida, houve a grande ladeira pela qual, com certa dificuldade, tive de atravessar, maz o fazia rápido e contente, pois sabia que ao final desta estava o caminho que mais agradava-me percorrer: aquele que levava meus passos com precisão de encontro aos teus. A essa altura, já não era mais senhor do meu corpo. Meus olhos lacrimejavam com teimosia irritante. Sentia-me frustado por não poder controlá-los, como também não podia controlar a velocidade dos meus passos, que aceleravam-se mais e mais. Precisa ver teus olhos. Percebi que isso era uma daquelas necessidades inquestionáveis do organismo: comer, beber e ver teu olhos. Finalmente passei pelos banquinhos, sendo o terceiro o mais importante de todos, pois ali conheci os teus anéis, os teus beijos e os códices da tua mente. Ali, também fui apresentado ao teus medos, que são, agora, os meus próprios, pois descobri nossa unidade irreparável. Digamos que a causa tenha sido o fato de que o sangue que percorre o corpo do guerreiro foi retirado dos lábios da feiticeira, portanto são um. Estando às vésperas da janela teu quarto, diminui o ritmo dos passos. Pus-me a esvaziar os pensamentos, pretendendo apenas sentir. Lentamente, prossegui. Posicionei-me diante da janela, que não estava muto além do alcance da minha visão. Sentei-me na grama. Já era noite, e tu sabes o quão imensamente aprecio a companhia da escuridão. Eu estava em casa. Lancei os olhos novamente para a janela. A luz estava acesa. Pelo vidro, pude notar gestos. Na verdade, não era mais um vidro, era um vitral. Um vitral gótico. Imaginei o que pudesse estar acontecendo por detrás daquele mosaico. Talvez estivesses dançando com um saia longa que a deixasse ainda mais bela enquanto dividia o ar conforme o desejo da tua cintura, ou ainda que estivesses praticando a magia antiga herdada pelas filhas de Odin. Independente do que fazias, havia graciosidade e misticismo  emanando do teu quarto, atingindo-me. Desejei ser aqueles vitrais. Desejei, também, não ser efêmero, para que pudesse desfrutar ilimitadamente de tua beleza pagã. Mas, a luz do quarto se apaga. Por alguns minutos tive a impressão de ter visto teus olhos mirando os meus. Não tentei fazer qualquer contato, que não a retribuição do olhar. Descobri, naquele momento, uma nova expressão do amor singelo: olhar os teus olhos negros na quase completa escuridão. Confesso nunca ter visto par de luzes tão incandescente. Daquele olhar, entendi a doçura das tuas palavras não proferidas. Bastava-me aquele olhar, tão somente aquele, para sentir o elo que havia entre mim e a garota do primeiro andar. Voltei pelo mesmo caminho em que fui, mas, desta vez, em harmonia com o universo. Vi os olhos da minha feiticeira e tudo estava bem.